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Complexo Hospitalar Prefeito Edivaldo Orsi (Hospital Ouro Verde), em Campinas: Vitale Saúde venceu chamamento público ainda com o nome de Santa Casa de Bariri – Divulgação

Alcir Zago

O Tribunal de Contas do Estado (TCE) decidiu pela irregularidade do chamamento público e do contrato de gestão firmado entre a prefeitura de Campinas e a Organização Social Vitale Saúde (hoje Santa Casa de Bariri) para administração das atividades e serviços de saúde, ensino e pesquisa do Complexo Hospitalar Prefeito Edivaldo Orsi (Hospital Ouro Verde), em Campinas.

O julgamento foi realizado na terça-feira (22). A partir da verificação de falhas nesse processo licitatório é que o Ministério Público (MP) deflagrou a primeira fase da Operação Ouro Verde (leia mais no box).

Para a relatora do caso no TCE, conselheira Cristiana de Castro Moraes, houve uma série de irregularidades no contrato firmado entre as partes, decorrente do chamamento público nº 02/2015 e do contrato de gestão nº 91/2016, ambos firmados pela prefeitura de Campinas com a Vitale Saúde.

O ajuste, que objetivou a gestão de atividades e serviços de saúde, ensino e pesquisa do complexo hospitalar, foi assinado em 2 de maio de 2016 no valor de R$ 645,3 milhões para vigência de 60 meses (R$ 10,7 milhões por mês).

O TCE acolheu em parte representação feita pela União Saúde Apoio (USA). O órgão também aplicou pena pecuniária individual no valor de 400 Ufesps (R$ 11 mil) ao prefeito de Campinas, Jonas Donizette Ferreira, e ao secretário de Saúde de Campinas, Cármino Antonio de Souza.

Em seu voto, a conselheira Cristiana ressaltou que a organização social era anteriormente chamada Irmandade da Santa Casa de Misericórdia de Bariri. A alteração da razão social ocorreu no dia 11 de novembro de 2015. No ano passado a Vitale voltou a ser denominada Santa Casa, mas sempre mantendo o mesmo CNPJ.

De acordo com a relatora, foram apuradas as seguintes falhas na contratação: insuficiência no detalhamento quanto à valoração do atendimento aos critérios técnicos de avaliação; carência de demonstrativo esmiuçado no Programa de Trabalho dos gastos projetados para serviços contratados e materiais; falta de parecer técnico evidenciando a vantagem econômica do ajuste; aceitação de atestados de capacidade técnica que não certificam a efetividade na aplicação de recursos relativos a ensino e pesquisa; e a não abertura dos envelopes em sessão com data predeterminada, divulgada e franqueada às participantes e demais interessados.

 

Defesa

 

Em seus esclarecimentos ao TCE, a organização social mencionou a inaplicabilidade de item da Lei de Licitações à hipótese de dispensa de licitação. Afirmou que, por se tratar de esfera municipal, valeu-se das prescrições contidas em decreto que regulamenta lei de Campinas de 2015.

Pontuou também que a legislação daquela cidade não contempla a obrigatoriedade de promover sessão pública para abertura de envelopes.

Sobre a ausência de proposta orçamentária e programa de investimentos, a Vitale Saúde citou estar devidamente comprovado seu encaminhamento ao TCE e que a economicidade existiu, estando evidente que a contratação trouxe vantagem econômica à prefeitura de Campinas.

O prefeito Jonas Donizette Ferreira defendeu-se relatando que o processo seletivo para contratação de organização social é disciplinado por lei especial e que foram obedecidos os critérios estabelecidos no chamamento público, tendo as entidades participantes sido convocadas para a sessão pública de divulgação e julgamento final.

Considerou também a juntada da proposta orçamentária e financeira para o custeio dos serviços, salientando que o chamamento público contou com tal previsão, argumentando que eventual falha na previsão de recursos não deveria macular o ajuste.

Em relação à falta de parecer técnico evidenciando a vantagem econômica para a administração, Ferreira relatou que o município procedeu a estudos comparativos com a folha de pagamento do Hospital Municipal Dr. Mario Gatti, cujo quadro de profissionais é semelhante ao Complexo Hospitalar Prefeito Edivaldo Orsi, que já superaria os custeios da parceria.

Finalizou dizendo que foi efetuada pesquisa de mercado para o estabelecimento de valores médios das atividades a serem executadas, bem como a justificativa de inviabilidade de municipalização do complexo hospitalar.

 

Gaeco denunciou gestores e políticos à Justiça

 

No início de dezembro de 2017 a Justiça de Campinas aceitou denúncia apresentada pelo Grupo de Atuação Especial Contra o Crime Organizado (Gaeco) contra seis pessoas acusadas pelos crimes de integrar organização criminosa, fraude em licitação, falsidade ideológica e peculato.

De acordo com os promotores de Justiça Daniel Zulian, Jandir Moura Torres Neto e José Cláudio Tadeu Baglio, os denunciados Aparecida de Fátima Bertoncello, Daniel Augusto Gonsales Câmara, Fernando Vítor Torres Nogueira Franco, Paulo Roberto Segatelli Câmara, Ronaldo Foloni e Ronaldo Pasquarelli agiram para burlar o chamamento público que definiria os responsáveis pela gestão do Complexo Hospitalar Prefeito Edivaldo Orsi (Hospital Ouro Verde), em Campinas. A ação criminal continua tramitando.

A investigação que apurou o envolvimento dos seis réus culminou na deflagração da primeira fase da Operação Ouro Verde.

Segundo a denúncia, a Vitale Saúde, antiga Irmandade da Santa Casa de Misericórdia de Bariri, foi a vencedora da seleção realizada pelo poder público para gerir o Hospital Ouro Verde. O Gaeco recebeu informações de que a Vitale Saúde seria composta por diretores e administradores oriundos da Pró-Saúde, organização social conhecida por ser investigada em inúmeras irregularidades praticadas em todo o País.

O Gaeco instaurou, então, procedimento investigatório que apontou para a existência de fraudes no chamamento público que teve a Vitale Saúde como vencedora.

A lei estabelece que as organizações sociais são pessoas jurídicas de direito privado, sem fins lucrativos. No entanto, dados obtidos por meio do monitoramento telefônico e de e-mails, além de análises do Gaeco, “demonstraram que, na verdade, as pessoas por trás da Vitale, que não se resumem àquelas constantes formalmente dos seus quadros diretivos, encobertadas sob o manto de uma entidade assistencial, usaram-na como instrumento para fraudar o chamamento público e obter vantagens patrimoniais indevidas, desviando dinheiro público”.

Ficou demonstrado que Paulo Câmara, Daniel Câmara e Ronaldo Pasquarelli, que não estavam formalmente vinculadas à Vitale, eram responsáveis de fato pela organização.

Já Aparecida Bertoncello e Ronaldo Foloni, respectivamente presidente e diretor-geral da entidade, não possuíam autonomia para tomada de decisões sobre os rumos da Vitale, considerando Paulo Câmara, Daniel Câmara e Pasquarelli como os efetivos “chefes do negócio”.

Os três tinham seu envolvimento com a Vitale formalmente disfarçado por contratos de consultoria. Ou seja, para que pudessem obter reais vantagens com o “negócio”, os reais responsáveis pela Vitale eram remunerados por pagamentos feitos pela organização social a título de consultoria, que, na prática, não era prestada.

E para que o esquema gerasse vantagens financeiras para os envolvidos, era preciso que a entidade assistencial em questão utilizada vencesse a seleção pública. Para tanto, os denunciados utilizavam artifícios para fraudar o caráter competitivo dos chamamentos públicos.

A Vitale entrou na licitação para gerir o Hospital Ouro Verde ainda como Santa Casa de Bariri, tendo a denominação social alterada só ao fim do processo. O chamamento acabou sendo suspenso quando Comissão Especial de Seleção alegou que pedidos de impugnações precisavam ser analisados.

“Chamou a atenção o vínculo de parte dos denunciados também com as entidades que fizeram os pedidos de impugnação que geraram a suspensão do processo de seleção, a qual manifestamente beneficiou a Vitale Saúde. As outras duas impugnações que serviram para protelar o chamamento, com a suspensão do certame, foram apresentadas pelas entidades OSJM e INDSH, as quais possuíam estreita relação com os denunciados Daniel Câmara, Paulo Câmara e Ronaldo Pasquarelli”, mencionou a denúncia.

 

Fonte: Ministério Público de São Paulo