Composição 1_1

Eduardo Calbucci

“Acreditamos no ensino híbrido. A sala de aula é muito importante, mas é preciso que exista uma complementação.”

Professor do ensino médio e do pré-vestibular, Eduardo Calbucci há sete anos começou a indagar sobre os motivos pelos quais bons alunos não conseguiam aprovação em exames vestibulares. Após uma série de estudos, concluiu que questões socioemocionais causavam certos bloqueios em alunos. Calbucci notou que havia poucos trabalhos adaptados à realidade brasileira e, por isso, ajudou a fundar o Programa Semente, focado em trabalhar habilidades socioemocionais em estudantes para o desenvolvimento pessoal, profissional e acadêmico deles. Na sexta-feira, dia 24, Calbucci esteve na Cooperativa Educacional de Bariri (Coeba), onde o projeto será implementado a partir deste ano, para conversar com a diretoria e professores. Residente em São Paulo, o entrevistado é formado em jornalismo, graduado em Letras, com mestrado e doutorado em Linguística. Atua como professor no Anglo, mas ultimamente tem dedicado mais tempo em mostrar a importância da educação socioemocional em escolas parceiras. “Toda empresa quer a competência técnica e a competência socioemocional, só que a segunda foi negligenciada por muito tempo. Hoje as escolas estão olhando para isso com mais carinho”, comenta ele.

Candeia – O que levou o senhor a ser um dos idealizadores do Programa Semente?
Calbucci – Minha grande experiência sempre foi o ensino médio e o curso pré-vestibular. A primeira luz que acendeu foi o porquê de tantos bons alunos não conseguirem aprovação no vestibular. Começamos a ver como o gerenciamento das emoções tem impacto realmente no aprendizado. Somei esforços com um grande amigo, professor de química e médico psiquiatra, professor Celso (Celso Lopes de Souza). Ele atuou sobre as neurociências e fomos mergulhando em programas espalhados pelo mundo, os quais já faziam isso há muito tempo. Percebemos que as iniciativas que existiam no Brasil eram tímidas ou traduções de programas de sucesso fora do País. Pensamos que havia a possibilidade de fazer algo adaptado à realidade brasileira. A produção do material do Programa Semente começou em 2016.

Candeia – Qual o alcance do programa hoje?
Calbucci – Desenvolvemos o Programa Semente pelo País todo. Temos pelo menos uma escola em cada unidade da federação. Isso é interessante pela diversidade. A maior parte das escolas está no Estado de São Paulo, colégios com os quais tivemos mais contatos, até mesmo pessoal. Hoje atingimos mais de 50 mil estudantes em mais de 150 escolas.

Candeia – Qual a abordagem feita pelo Programa Semente junto a alunos, professores e pais?
Calbucci – O programa vai do infantil ao ensino médio. Acreditamos no ensino híbrido. A sala de aula é muito importante, mas é preciso que exista uma complementação e esta é a nossa plataforma. Temos material para pais, professores e alunos para que todas as engrenagens de uma escola se envolvam nesse projeto. É um professor da própria escola que ministra o programa. Os estudos mostram que quanto mais o professor conhece a dinâmica da escola, melhor será o resultado.

Candeia – Quais os resultados do Programa Semente observados até o momento, considerando-se que é um projeto ainda novo?
Calbucci – No primeiro ano fizemos uma parceria com a Universidade Federal do Rio de Janeiro. O professor Bruno Damasio (do Instituto de Psicologia) mediu o impacto do Programa Semente. Podemos dizer que ao longo de um ano houve evolução em todas as áreas. Os alunos aprenderam a reconhecer mais as emoções, gerenciá-las melhor, serem mais empáticos, mais perseverantes e tomarem melhores decisões. Uma das grandes dificuldades é justamente mensurar isso. Temos o feedback (retorno) das próprias escolas, que dizem que está funcionando, mas fomos em busca dessa pesquisa. Fizemos publicações em revistas científicas, mostrando como estávamos avaliando o programa. Se fosse preciso, iríamos fazer os ajustes em nosso material.

Candeia – As questões socioemocionais estão mais latentes na educação de hoje?
Calbucci – Isso sempre existiu, mas com as mudanças nos arranjos familiares as questões socioemocionais ficaram mais urgentes ainda. O mundo está mudando. Os jovens de hoje estão tendo de lidar com uma velocidade de informação que minha geração não precisou viver. Costumo fazer uma comparação: hoje todos concordam que fazer atividades físicas é saudável. Foi uma surpresa quando a educação física foi colocada nos currículos escolares. Espero que daqui a um tempo a educação socioemocional seja uma atividade como qualquer outra, necessária para o desenvolvimento pleno de um estudante. Uma das vantagens do programa é que ajudamos a escola a identificar problemas com os alunos. O professor ganha habilidade para saber quando algo está destoando. Quando uma escola não sabe o que fazer com o filho, os pais já mandam para o profissional de saúde. Às vezes há muita coisa que a escola pode fazer antes. O programa ajuda a escola até mesmo a diagnosticar que alunos efetivamente precisam de um psicólogo, de um psicopedagogo e em alguns casos até de um médico.

Candeia – O senhor relata que antes havia a formação escolar seguida do trabalho profissional. Hoje, com o avanço da tecnologia, o aprendizado é mais constante…
Calbucci – Há estimativa do Banco Mundial de que dois terços dos jovens que estão na educação básica hoje vão trabalhar numa profissão que ainda não existe. Como preparar um jovem para uma profissão que ainda não existe? É preciso dar a ele ferramentas para lidar com a mudança. Quando ensino esse jovem a ser flexível, perseverante, determinado, na verdade estou fazendo o que posso para que seja uma pessoa satisfeita ao longo do século 21. A boa notícia é que essas competências podem ser ensinadas. Toda empresa quer a competência técnica e a competência socioemocional, só que a segunda foi negligenciada por muito tempo. Hoje as escolas estão olhando para isso com mais carinho.

Candeia – Alguma consideração adicional?
Calbucci – O mais importante é que todos entendam isso: durante muito tempo imaginamos que cooperação, resiliência, flexibilidade, liderança eram coisas com as quais as pessoas nasciam. As neurociências mostram que não é assim. Da mesma forma que aprendo matemática, inglês e a andar de bicicleta, aprendo também essas habilidades. A escola é um local privilegiado para isso é o que vai ajudar nossos filhos a serem profissionais mais bem-sucedidos e pessoas mais realizadas.