Silvia Gandara – “Não podemos compactuar com a falta de uma política pública voltada ao atendimento da educação especial, que garanta suporte aos professores, aos cuidadores, às escolas em geral, para que possam promover uma inclusão de fato”.
De 23 a 27 de agosto, a Associação de Pais e Amigos dos Excepcionais de Bariri (Apae) realizou a Semana Nacional da Pessoa com Deficiência, em consonância com a Federação Nacional das Apaes. Em entrevista ao Candeia, a diretora Silvia Maria de Barros Gandara, afirma que é preciso “intensificar o debate, a sensibilização e mobilização da sociedade acerca da importância da inclusão e da luta pelos direitos das pessoas com deficiência no Brasil”. Para que isso ocorra, no entanto, ela ressalta a importância de políticas públicas voltadas ao atendimento da educação especial. “Um aluno com deficiência não atrapalha uma sala de aula, desde que lhe seja garantido, ao mesmo tempo, todos os recursos necessários para sua aprendizagem, de acordo com o seu ritmo”, opina Sílvia. Na entrevista, ela ainda comenta o objetivo das ações que integram a Semana da Pessoa com deficiência; o trabalho na Apae durante a pandemia de Covid-19 e a estratégias e protocolos para retorno das atividades presenciais; parcerias e programas mantidos pela entidade em Bariri; e a fala do atual Ministro da Educação, que criticou o “inclusivismo” e alegou “dificuldades de convivência” de crianças com deficiência.
Candeia – Qual o objetivo da Apae de Bariri com a Semana da Pessoa com Deficiência realizada neste ano?
Sílvia Gandara – O objetivo principal da Semana da Pessoa com Deficiência é intensificar o debate, a sensibilização e mobilização da sociedade acerca da importância da inclusão e da luta pelos direitos das pessoas com deficiência no Brasil. A Apae de Bariri se engaja nessa iniciativa e elaborou uma programação que possibilita, ainda que predominantemente à distância, essa mobilização, o seja, por meio da página do Facebook da Apae, Instagram e mídias locais
Candeia – No período mais agudo da pandemia, como a Apae desenvolveu suas atividades junto aos alunos nas áreas de educação, social e saúde?
Sílvia Gandara – No período mais agudo, seguindo legislações estaduais e municipais, somadas às orientações técnicas de saúde, manteve seu serviço com distanciamento social, ficando apenas alguns funcionários do administrativo na entidade. Entretanto, buscando cumprir planos de trabalho e calendários, na saúde manteve atendimento dos casos mais urgentes e com adesão dos pais; no social, atuou por meio de contatos por whatsapp, telefones para acompanhamento e estudos de casos em situação de maior vulnerabilidade; na educação, atuou por meio de ensino remoto, por whatsapp, you tube e, na falta de recursos tecnológicos, por meio da entrega de cadernos às famílias dos alunos, semanalmente.
Candeia – A entidade retomou as atividades presenciais nessa semana? Que medidas estão sendo tomadas para a segurança de alunos e funcionários da Apae?
Sílvia Gandara – Retornamos as atividades nas três áreas. Na saúde, com atendimento aos 100% dos pacientes, com exceção daqueles em que os pais assinaram afastamento temporário, por conta da Covid-19; no social e educação retornamos com 60% dos alunos: aqueles que já tomaram a 2ª dose da vacina, os pais assinaram termo de adesão e responsabilidade e que acatam às regras de sanitização, com uso e troca de máscaras, uso de materiais pessoais para sua higiene, garantidos pela Apae. O ambiente foi cuidadosamente preparado para garantir os critérios de biossegurança exigidos.
Candeia – A pandemia da Covid-19 trouxe perdas no processo de aprendizagem por causa do distanciamento entre as pessoas. De que forma a Apae pretende atuar para recuperar o trabalho?
Sílvia Gandara – Com certeza a pandemia trouxe sérios prejuízos aos alunos, não só da Apae, mas creio que para todos, pois a pandemia não interrompeu apenas as aulas presenciais, o convívio social, a aprendizagem e a rotina estruturada dos alunos. Somados a esses efeitos negativos, o estado emocional de estudantes e docentes está sendo marcado por sentimentos que concorrem para desmotivá-los diante de tantas dificuldades e desafios, por conta da insegurança provocada pelo cenário que ainda se apresenta. É previsto como reflexo também aumento da quantidade de abandono aos estudos e a falta de estímulo para o retorno ao espaço escolar, se não forem desenvolvidas propostas para além do retorno à escolaridade. É preciso nesse projeto de retorno comprometer-se com o restabelecimento de vínculos afetivos, alternativas motivacionais e usos de pedagogias diferenciadas. A esse cenário, soma-se, infelizmente, que a pandemia de Covid-19 deixa mais evidente a situação de desigualdade no âmbito da educação brasileira. A situação trouxe à tona problemas como: a falta de recursos digitais, a dificuldade de aprendizagem dos alunos portadores de deficiência e o impacto da saúde mental em crianças e jovens, entre outros. É imprescindível, portanto, que as propostas de retorno articulem aspectos emocionais, relacionais e cognitivos, às famílias, alunos e professores.
Candeia – Como está a parceria da entidade com as prefeituras de Bariri e da região para atendimento dos alunos?
Sílvia Gandara – A Apae de Bariri tem parceria com a prefeitura municipal de Bariri nas três áreas da saúde, social e educação. Com as prefeituras de Itaju e Boraceia, a parceria se estabelece para atendimento de alunos e programa social. Além das parcerias em nível local, mantém colaboração, em nível de Estado, com a Secretaria de Educação, para o funcionamento da Escola Especial, atendendo os anos iniciais e na área social, a parceria se estabelece também em nível federal. Cada área com sua especificidade, desenvolve planos de trabalho também com objetivos próprios.
Candeia – E as parcerias com a iniciativa privada e auxílio da população nas ações realizadas pela instituição?
Sílvia Gandara – Com a iniciativa privada a Apae tem conseguido parcerias para o desenvolvimento de projetos que atendem não só diretamente os assistidos, como também possibilita a melhoria de estrutura, organização e capacitação dos colaboradores. Outra forma de captação de recursos são os eventos, campanhas e doações, graças à colaboração da comunidade, empresas, profissionais autônomos e comércio em geral.
Candeia – O ministro da Educação, Milton Ribeiro, fez recente declaração sobre as dificuldades de convivência de crianças com deficiência com outros estudantes em determinadas situações. Qual a opinião da senhora sobre isso?
Sílvia Gandara – Partimos do princípio de que cada pessoa é única e a educação deve ser acessível para todos, de acordo com as suas individualidades. Não compactuamos com o preconceito, com a falta de tolerância para às pessoas com deficiência. A convivência de crianças com deficiência e outros estudantes não representa dificuldade. Todos aprendem sobre a vida, com essa criança. Entretanto, uma escola tem que cumprir também não só com convivência social, mas com resultados de aprendizagem. E nesse caso, não podemos compactuar também com a falta de uma política pública voltada ao atendimento da educação especial, que garanta suporte aos professores, aos cuidadores, às escolas em geral, para que possam promover uma inclusão de fato. A responsabilidade de uma escola regular, ao receber um aluno com deficiência, seja com casos leves ou mais graves, deve ser cumprida, entretanto, dependendo do caso atendido, não basta uma sala de aula e um único professor. Existe todo um aparato necessário para atender dignamente um aluno com deficiência na sala de aula. Assim, um aluno com deficiência não atrapalha uma sala de aula, desde que lhe seja garantido, ao mesmo tempo, todos os recursos necessários para sua aprendizagem, de acordo com o seu ritmo. O que se presencia é um parco investimento na educação especial e uma exigência fenomenal de todos que atendem no chão de escola.
Saiba mais sobre a entrevistada
Silvia Maria de Barros Gandara é formada em Pedagogia e Letras, com especializações na área de Psicopedagogia e Neuropsicopedagogia; Formação Continuada em Conselhos Escolares (Ufscar/SP); Ética, Valores e Cidadania na Escola (USP/Bauru); Gestão da Rede Pública para Supervisores de Ensino (USP/SP); e Planejamento e Gestão de Organizações Educacionais (Unesp Araraquara/SP). É mestre em Educação, com ênfase em Gestão Educacional e Formação Continuada de Gestores. Iniciou no magistério público estadual como professora de Inglês e Português, e também atuou como diretora de escolas em Boraceia e Itaju. Foi coordenadora da rede municipal de ensino de Bariri, assim como secretária municipal de educação. Aposentou em 2015, como supervisora de ensino, na Diretoria Regional de Ensino de Bauru. Assumiu a direção da Apae de Bariri em 2020, em meio à pandemia de Covid-19.
Semana da Pessoa com Deficiência
Os eventos programados para a semana pela Apae de Bariri ocorrem tanto de forma virtual como presencial – Divulgação
Sexta-feira, 27, a Associação de Pais e Amigos dos Excepcionais de Bariri (Apae) encerrou a Semana Nacional da Pessoa com Deficiência, com o lançamento da carteira municipal de identificação do autista. O evento ocorreu no Centro Educacional, Cultural e de Exposições Mario Fava, às 9h, com presença de autoridades e integrantes da Apae.
Durante toda a semana, a entidade promoveu ações de conscientização, com o tema “É tempo de transformar conhecimento em ação”. A ideia é que direitos e conquistas garantidos por lei se efetivem na vida diária das pessoas em situação de deficiência.
Segunda-feira, 23, houve divulgação de vídeo, com a participação de usuários da Apae em programa do setor de serviço social. O tema é “Respeite os Nossos Direitos”. A atividade foi virtual, através da página do Facebook da Apae.
Pedágio entre a Rua Tiradentes e Avenida Claudionor Barbieri marcou ação de panfletagem, realizada terça-feira, 24, das 11 às 13h. Equipes da Apae e do Creas, com a participação de usuários e alunos, entregaram panfletos com resumo do Estatuto dos Direitos da Pessoa com Deficiência.
Quarta e quinta-feira, 25 e 26, a programação voltou a ser virtual, com transmissão de vídeos. O primeiro relatou ações do Conselho Municipal da Pessoa com Deficiência (CMPD) e o segundo, de caráter institucional e produzido pela Apae de Bariri.